JOSÉ AYRES NETTO, ilustre cirurgião brasileiro, nasceu a 8 de julho de 1878 na cidade do Rio de Janeiro. Fez o curso secundário em São Paulo, como aluno interno do Colégio Ivai. na antiga Ladeira Porto Geral. Aos 11 anos, testemunhou a transformação do regime político do Brasil, a 15 de novembro de 1889. presenciando a queda em São Paulo do Presidente General Couto de Magalhães. Em 1896 partia para o Rio de Janeiro, a fim de matricular-se na Faculdade de Medicina. Ali viveu como estudante pobre, tomando refeições em casa de parentes, alojando-se em pensões modestas, em companhia de colegas, no mesmo quarto, dividindo as despesas. Alcides Ferreira Alves, primeiramente e depois Olegário de Moura, foram seus constantes companheiros. Ao deixar as aulas do 2.° ano, foi nomeado interno no desempenho de várias atividades. Trabalhou, mais tarde, no serviço de Cirurgia Abdominal e de Obstetrícia e Ginecologia. Colou grau, com distinção, a 16 de dezembro de 1901, jamais abandonando a clínica ginecológica, socorrendo-se dela preparar sua tese de doutoramento. Pela mesma Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, já se havia diplomado em Farmácia, a 6 de fevereiro de 1899.
Vindo para São Paulo, procurou Arnaldo Vieira de Carvalho, na velha Santa Casa de Misericórdia. Aí foi seu assistente durante longos anos.
Durante toda sua vida Ayres Netto dedicou-se de corpo e alma à Santa Casa de Misericórdia, onde um serviço especializado lhe consagra o nome. É ele conhecido pelos inúmeros trabalhos publicados em revistas nacionais e estrangeiras e pelas magníficas instalações obtidas a custa de donativos de almas caridosas que respondiam generosamente às “cartas de amor” do chefe inesquecível, nome pelo qual, na enfermaria, se apelidou as “facadas epistolares” . De fato, assinalou Altino Antunes, Ayres Netto pedia para seu serviço como mendigo, obtendo sempre o apoio irrestrito de todos. O encontro de Ayres Netto com Arnaldo Vieira de Carvalho datou de 1902. Em 1952 comemorou o cinqüentenário de sua constante colaboração à Santa Casa de Misericórdia. Em 1962 renderam-lhe ali homenagem por sessenta anos de grandes serviços. E ele já contava, então, oitenta e quatro anos. Saudou-o o provedor dessa instituição, o Dr. Christiano Altenfelder Silva. Em um dos trechos de sua formosa oração referiu: “Devo curvar-me diante da pessoa de José Ayres Netto, como reverência e homenagem pelos 60 anos, nos quais sua ciência e sua mão abençoada vem fazendo tanto pelos doentes pobres de todo o país”.
Assistente de Arnaldo Vieira de Carvalho, ao se criar a Faculdade de Medicina de São Paulo e ao se instalar em 1918 a cadeira de Ginecologia, Ayres Netto foi nomeado assistente e, com a morte de Arnaldo, assumiu a regência da cátedra, até que esta teve provimento efetivo.
Certa feita, Oswaldo Portugal, saudando-o no Instituto Arnaldo Vieira de Carvalho, não fez mais que interpretar, com estas palavras; os sentimentos de um sem-número de clientes do eminente e autêntico médico. “Certa vez já o comparei a São Francisco de Assis, pela grandeza de alma, amor ao próximo, pela humildade e pela candura”. Ao vê-Io agora partir para sempre, a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo perde um pedaço de si mesma. Outros virão substituí-Io, mas a lembrança do seu nome jamais se apagará dentro das velhas paredes daquela benemérita instituição.
De grande nobreza de sentimentos, coração sempre aberto a todos os desígnios elevantados, Ayres Netto deixou de sua presença uma lembrança inapagável que o tempo não fará senão avultar.
Foi Membro Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões e o 2º Mestre da História do Capítulo de São Paulo, de 1943 a 1945.
O filho, Dr. Pedro Ayres Netto, foi médico ginecologista da Santa Casa durante muitos anos, tendo sido 2º Vice-Provedor no triênio 1984-1987.
Faleceu o eminente cirurgião na cidade de São Paulo, no dia 6 de novembro de 1969.